Sinto tua dor
Irmã
porque ela se repete
tantas vezes
que parece uma ferida
que se recusa a cicatrizar.
Sinto tua dor
Irmã
porque os tombos que levas
pelos empurrões dos outros
pelas palavras dos outros
pelas ações dos outros
ralam também
os meus joelhos.
Sinto tua dor
Irmã
porque tuas lágrimas
clamam pelas minhas
porque teu grito
ecoa em minhas paredes
porque teu pedido
não atendido
se assemelha ao meu.
Sinto tua dor
Irmã
porque ela brilha
tão forte
que é capaz de cegar.
Sinto tua dor
Irmã
porque ela é forte
mas sabe se anular
quando é causada
por alguém que mora
dentro de ti.
Sinto tua dor
Irmã
porque ela ensina
a transformar pedra em flor
ódio em amor
tapa em beijo
lágrima em sorriso
opressão em luta.
Sinto tua dor
Irmã
porque finalmente
tu a tornastes pública
tu a tornastes viva
tu a tornastes nossa.
Sinto tua dor
Irmã
porque se cortam tua carne
a minha também sangra
se tapam tua boca
meus olhos também berram
se estupram teus direitos
eu também me imponho
se desrespeitam tua voz
eu te empresto a minha
se violam o teu corpo
o meu também é marcado
se vigiam teu rebolado
eu danço contigo
se condenam tua saia
eu visto a mesma
se criticam tuas escolhas
eu as aplaudo de pé
se te derrubarem
eu te dou a mão
se te chutarem
cairei e levantarei contigo
se te matarem
em nós tu renascerás.
Originalmente publicado no Medium em abril de 2020.
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